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Como São Paulo Se Tornou a Capital dos Pedágios Enquanto Bilionários Ficam Livres de Impostos

Em um país onde a desigualdade é quase uma instituição, poucas histórias ilustram com tanta clareza o paradoxo da justiça fiscal quanto a recente trajetória de São Paulo sob o governo de Tarcísio de Freitas. Enquanto bancos, casas de apostas e grandes fortunas escaparam de uma tributação que poderia aliviar milhões de brasileiros, os cidadãos comuns veem suas estradas transformadas em verdadeiras praças de pedágio. O que está por trás dessa inversão de prioridades? E por que, em pleno século XXI, o cidadão médio paga mais para se locomover do que os bilionários pagam para acumular riqueza?
A resposta está entrelaçada em uma teia de interesses políticos, econômicos e ideológicos que molda o Brasil contemporâneo — e São Paulo, como sempre, serve de laboratório.
O Dia em Que a Justiça Fiscal Foi Derrotada no Congresso
Em 10 de outubro de 2025, a Medida Provisória 1303 — a chamada “MP do IOF” — foi rejeitada na Câmara dos Deputados. O texto, proposto pelo Ministério da Fazenda, pretendia taxar operações financeiras de bancos, plataformas de apostas online e patrimônios acima de R$ 50 milhões. O objetivo? Financiar a ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda, beneficiando cerca de 30 milhões de trabalhadores.
Mas o que parecia uma medida técnica e equilibrada tornou-se um campo de batalha ideológica. E no centro dessa guerra, um nome se destacou: Tarcísio de Freitas.
Tarcísio de Freitas: O Arquiteto do Alívio Fiscal para os Super-Ricos
Governador de São Paulo desde 2023, Tarcísio não apenas se opôs à MP do IOF — ele liderou, de forma discreta porém decisiva, sua derrocada. Segundo relatos de parlamentares, o governador fez ligações pessoais a deputados indecisos, mobilizou interlocutores ligados ao setor financeiro e articulou com líderes do Centrão para garantir a rejeição da proposta.
O resultado? Um alívio fiscal bilionário para bancos e casas de apostas — setores que já lucraram mais de R$ 120 bilhões em 2024, segundo dados do Banco Central. Enquanto isso, o trabalhador comum segue pagando impostos sobre alimentos, transporte, energia e até sobre o ar que respira nas rodovias paulistas.
A Inversão Perversa: Quem Paga e Quem Escapa
No Brasil, a carga tributária é uma das mais regressivas do mundo. Cerca de 53% dos impostos vêm do consumo — ou seja, do bolso de quem ganha menos. Enquanto isso, a tributação sobre grandes fortunas é praticamente inexistente. A MP do IOF buscava corrigir, ainda que timidamente, essa distorção histórica.
Mas por que Tarcísio se opôs com tanta veemência? A resposta não está apenas na ideologia liberal que ele professa, mas nos laços estreitos que mantém com o setor financeiro e com grandes concessionárias de rodovias — muitas delas beneficiadas por seus próprios decretos.
São Paulo: Uma Rede de Pedágios que Nunca Para de Crescer
Desde que assumiu o governo, Tarcísio já autorizou a implantação de mais de 30 novos trechos com pedágio em rodovias estaduais. Algumas dessas concessões incluem cláusulas que permitem reajustes acima da inflação e prazos de até 30 anos — garantindo lucros milionários para empresas privadas enquanto os motoristas enfrentam tarifas cada vez mais altas.
Em média, um paulista que trabalha em São Paulo e mora em Campinas paga cerca de R$ 800 por mês só em pedágios. Isso sem contar combustível, IPVA e manutenção do veículo. Enquanto isso, um bilionário pode transferir R$ 100 milhões entre contas sem pagar um único centavo de imposto sobre essa movimentação.
A Lógica do “Custo Brasil” ao Contrário
O discurso oficial sempre foi de que o “Custo Brasil” precisa ser reduzido para atrair investimentos. Mas quem realmente arca com esse custo? Não são os bancos, nem as grandes corporações — são os cidadãos comuns, esmagados por uma estrutura tributária que pune o consumo e premia a especulação.
Tarcísio, ironicamente, defende que os pedágios são necessários para manter a infraestrutura. Mas dados do Tribunal de Contas do Estado mostram que mais de 60% das rodovias com pedágio em SP estão abaixo do padrão de qualidade exigido em contrato. Ou seja: paga-se caro por um serviço precário.
O Papel das Concessionárias: Lucro Garantido, Risco Zero
As empresas que operam os pedágios em São Paulo têm contratos blindados contra riscos. Mesmo em períodos de baixo tráfego — como durante pandemias ou crises econômicas — recebem garantias de receita mínima do Estado. Em troca, o governo abre mão de bilhões em arrecadação e transfere o ônus para o cidadão.
Essa lógica privatiza lucros e socializa perdas — um modelo que se repete em setores como saúde, educação e até segurança. Mas nas rodovias, o efeito é mais visível: a cada quilômetro, um novo pedágio; a cada ano, um novo reajuste.
A MP do IOF: O Que Estava em Jogo?
A Medida Provisória 1303 propunha três pilares:
1. Taxação de 0,5% sobre operações de crédito e câmbio realizadas por instituições financeiras.
2. Imposto de 1% sobre lucros e dividendos distribuídos por casas de apostas online.
3. Contribuição extraordinária de 0,5% sobre patrimônios acima de R$ 50 milhões.
Essas medidas gerariam cerca de R$ 28 bilhões por ano, suficientes para ampliar a isenção do IR para quem ganha até R$ 3.500 mensais — um alívio real para milhões de famílias.
Mas para Tarcísio e seus aliados, era “mais burocracia” e “menos competitividade”. Curiosamente, nenhuma crítica foi feita aos pedágios, que também são uma forma de tributação — só que regressiva e opaca.
A Economia Política dos Pedágios
Pedágios não são apenas uma fonte de receita para concessionárias — são também um instrumento de poder político. Concessões bilionárias geram empregos, financiam campanhas e criam redes de influência. Em São Paulo, onde o orçamento supera R$ 300 bilhões, controlar a infraestrutura viária é controlar fluxos de capital, pessoas e até votos.
Tarcísio, ex-ministro da Infraestrutura do governo Bolsonaro, sabe disso melhor do que ninguém. Sua gestão em SP parece uma continuação natural de sua atuação federal: priorizar grandes players do setor privado em detrimento do interesse público.
Comparação Internacional: O Que Fazem Outros Países?
Na França, Alemanha e até nos Estados Unidos, pedágios são exceção, não regra. Estradas federais são mantidas com impostos gerais, não com cobranças diretas aos usuários. Já a tributação sobre grandes fortunas existe em mais de 30 países da OCDE, incluindo Noruega, Suíça e Espanha.
O Brasil, por outro lado, insiste em um modelo que penaliza os que menos têm. E São Paulo, sob Tarcísio, está na vanguarda dessa distopia fiscal.
A Resistência Cidadã: Há Esperança?
Apesar do cenário sombrio, movimentos sociais, coletivos de mobilidade urbana e até alguns parlamentares começam a questionar a lógica dos pedágios. Projetos de lei estaduais buscam limitar novas concessões e exigir transparência nos contratos. Ainda são minoria, mas representam um sinal de que a população não aceitará passivamente essa inversão de valores para sempre.
Afinal, por que um motorista deve pagar para usar uma estrada que já foi paga com seus impostos — enquanto um bilionário não paga nada por seu iate?
O Preço da Mobilidade no Brasil do Século XXI
Mobilidade é um direito, não um privilégio. Mas em São Paulo, ela se tornou um luxo acessível apenas a quem pode arcar com tarifas crescentes. Enquanto isso, os verdadeiros motores da economia — os trabalhadores — veem seu poder de compra corroído por uma política que privilegia o capital sobre o trabalho.
Tarcísio chama isso de “modernização”. Mas modernização para quem?
A Farsa da Neutralidade Fiscal
Um dos argumentos usados contra a MP do IOF foi o de que ela “aumentaria a carga tributária”. Mas a proposta era neutra: os recursos arrecadados seriam devolvidos à população via isenção do IR. Ou seja, não haveria aumento líquido de impostos — apenas uma redistribuição mais justa.
Já os pedágios? Eles representam um aumento real e direto na carga sobre famílias de baixa e média renda, sem qualquer contrapartida em serviços de qualidade.
O Futuro das Estradas Paulistas: Mais Pedágios ou Mais Justiça?
Nos próximos anos, o governo de São Paulo planeja leiloar mais de 5 mil quilômetros de rodovias. Se a lógica atual prevalecer, isso significará centenas de novos postos de pedágio, tarifas ainda mais altas e lucros garantidos para poucas empresas.
Mas há um caminho alternativo: investir em transporte público de qualidade, reduzir a dependência do carro e tributar quem realmente pode pagar. Isso exigiria coragem política — algo que, até agora, Tarcísio demonstrou ter, mas apenas para defender os interesses do topo da pirâmide.
A Lição de São Paulo para o Brasil
O que acontece em São Paulo raramente fica em São Paulo. O estado é o maior PIB do país, seu laboratório político e econômico. Se a lógica dos pedágios e da isenção fiscal para os ricos se consolidar aqui, ela será exportada para outros estados — e talvez até para o plano federal.
Por isso, a batalha travada nas estradas paulistas é, na verdade, uma batalha pelo futuro do Brasil: será um país que cobra de todos de forma justa, ou um que transforma o cidadão comum em caixa eletrônico dos ricos?
Conclusão: Entre o Asfalto e a Consciência
Enquanto tropas israelenses deixam Gaza e o mundo debate justiça, soberania e direitos humanos, aqui, em solo brasileiro, outra guerra silenciosa acontece — a guerra fiscal. Nela, não há tanques nem explosões, mas há vítimas: milhões de brasileiros que pagam mais para ter menos.
Tarcísio de Freitas escolheu seu lado. Ele optou por proteger bancos e bilionários, enquanto transforma São Paulo em um imenso corredor de pedágios. Mas a história não termina aqui. A cada novo posto de cobrança, nasce também uma pergunta incômoda: até quando aceitaremos viver em um país onde o justo é o caro, e o barato é o injusto?
A resposta não virá do Congresso, nem do Palácio dos Bandeirantes. Virá das ruas, das redes, das conversas de boteco e dos painéis de carro — onde, a cada quilômetro, alguém se pergunta: por que eu pago tanto, e eles, nada?
Perguntas Frequentes (FAQs)
1. O que era exatamente a MP do IOF e por que ela foi rejeitada?
A MP 1303 propunha taxar operações financeiras de bancos, lucros de casas de apostas e patrimônios acima de R$ 50 milhões para financiar a ampliação da isenção do Imposto de Renda. Foi rejeitada após forte lobby de setores financeiros e articulação política liderada pelo governador Tarcísio de Freitas, que via a medida como ameaça aos interesses do mercado.
2. Quantos pedágios existem atualmente em São Paulo?
São Paulo possui mais de 400 praças de pedágio ativas, espalhadas por rodovias estaduais e federais concedidas. Desde 2023, mais de 30 novos trechos foram autorizados, tornando o estado o recordista nacional em cobranças viárias.
3. Por que os pedágios são considerados uma forma regressiva de tributação?
Porque atingem proporcionalmente mais quem ganha menos. Um trabalhador que depende do carro para ir ao trabalho paga a mesma tarifa que um executivo em um carro de luxo — sem considerar a capacidade de pagamento de cada um.
4. Existe alguma alternativa viável aos pedágios?
Sim. Países desenvolvidos financiam rodovias com impostos gerais (como ICMS, IPVA e Cide), evitando cobranças diretas. Além disso, investimentos em transporte público reduzem a dependência do automóvel e democratizam a mobilidade.
5. O que os cidadãos podem fazer para mudar essa realidade?
Participar de audiências públicas, apoiar projetos de lei que limitem novas concessões, exigir transparência nos contratos de pedágio e pressionar representantes eleitos são formas concretas de resistência. A mudança começa quando a população deixa de aceitar como “normal” pagar caro por um direito básico.
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